Eppur si muove!
Reproduzimos abaixo mensagem recebida de um colaborador do blog, com a intenção de estimular a discussão sobre a retomada da ofensiva das classes dominadas na luta de classes.
Caros camaradas do blog Cem Flores,
O povo está nas ruas, no Brasil inteiro, um dia após o outro, aos milhões!
Este fato domina todos os outros. Este é o aspecto mais imediato e central (ainda que tenha causas profundas) da conjuntura da luta de classes no Brasil hoje.
Vemos o temor generalizado à direita e à “esquerda” (sic!) ante este fantasma. Temor do governo federal (também dos estaduais e municipais) que achava que suas “bolsas-família” e congêneres haviam acabado para todo o sempre com as manifestações populares. Temor dos partidos tradicionais (PT, PSDB, PMDB, DEM, PCdoB, PSB, PDT, etc.) que veem surgir algo que não sejam “manifestações” de mentirinha, canalizadas para aquele antro de corrupção institucionalizado que é o Congresso Nacional. Temor das centrais e dos sindicatos pelegos, que achavam que sua falta de ligação com as massas ou sua ação direta para paralisá-las surtiria efeito permanente e perpétuo. Temor da imprensa burguesa, que ao clamar pela repressão policial aos “baderneiros” e “vândalos”, deu a senha para a brutal ação policial que se seguiu.
Não faltam também os burocratas e “caga-regras” de plantão a querer dar ordens e lições às massas nas ruas. Dizem eles:
- Não há programa claro de reivindicações! Não há pauta definida!: Para poderem levar ao governo e ao Congresso, trocando as ruas por gabinetes, e acabar logo com isso e voltarem todos a trabalhar;
- Não existem lideranças claras!: Para que governo ou partidos possam tentar cooptar ou a polícia fazer uma repressão mais seletiva.
Achando que devemos escapar das armadilhas da ideologia burguesa do reformismo e do oportunismo expressas nos dois parágrafos anteriores, quero dizer que acho que são também imperiosas a nós, comunistas, duas medidas:
- participar ativamente das manifestações, no melhor sentido de “aprender com as massas” e de “viver entre as massas como um peixe no rio” e
- discutir coletivamente esse movimento, suas causas profundas e imediatas, suas tendências, seus limites e suas perspectivas.
Gostaria de tentar colaborar com essa discussão, apresentando abaixo algumas formulações gerais, esquemáticas e provisórias, destinadas a serem retificadas e aprofundadas no debate com os camaradas:
- Como aprendi lendo e debatendo os artigos do blog, a crise do imperialismo agrava todas as contradições do capitalismo, destacadamente as contradições entre classes dominantes e dominadas, com pressão para o aumento da exploração capitalista, o que agrava as condições de vida das massas.
- Particularmente no Brasil dos últimos anos, os reflexos da crise e das mudanças na divisão internacional do trabalho que ela acarreta se expressam em uma redução do crescimento da economia, um menor crescimento real dos salários, e primeiro em uma estagnação e agora uma possível reversão da tendência de queda do desemprego.
- Essa piora nos empregos e salários encontra, por um lado, uma massa já altamente endividada e, por outro, é acompanhada de alta inflação em geral (6,5%) e especialmente nos alimentos (14%). Todos esses fatores reduzem ainda mais o dinheiro efetivamente disponível para o mês.
- Nesse cenário de deterioração das condições concretas de vida, surgem os exemplos de outros levantes no mundo inteiro, dos mais diversos, seja no Egito ou na Grécia, Espanha, Portugal, Estados Unidos, Argentina, Turquia, etc.
- A receita então já estava pronta, só faltando uma chispa para incendiar essa pradaria. E vieram várias: aumento nas passagens de ônibus combinado com a péssima qualidade dos transportes públicos em todo o país, engarrafamentos gigantescos enfrentados sem qualquer conforto em lotações lotadas, horas e horas perdidas para ir e voltar do trabalho; corrupção sem limites nas obras bilionárias da Copa, isso para não falar da corrupção geral e absoluta, um verdadeiro esgoto a céu aberto; etc.
As manifestações já conseguiram uma importante vitória concreta. Um a um estão sendo derrubados os aumentos das tarifas de ônibus. Primeiro em São Paulo, depois no Rio de Janeiro. Outras cidades já comemoram a mesma vitória.
Se por um lado, essa história não para por aqui, por outro, não sabemos para onde ela nos levará, como as manifestações evoluirão, qual a organização de massas que ela poderá gerar. Inúmeras questões ainda permanecem inteiramente em aberto.
Para nós, comunistas, o importante é que essas manifestações confirmam a hipótese de que o recuo da resistência e da luta de massas ante a ofensiva da burguesia (e seu governo do PT, seus sindicatos pelegos, sua imprensa, etc.) chegou ao fim – no Brasil como em vários outros lugares do mundo – e que as massas poderão retomar a iniciativa na luta de classes.
Retomada que se dará partindo dos limites da situação atual, fruto de uma prolongada defensiva da classe operária e demais classes exploradas, da ausência de partidos comunistas, revolucionários (perdão pelo pleonasmo!), do menor papel desempenhado hoje pela teoria científica de classe, o marxismo, pela falta de um programa para a revolução brasileira. Mas, ainda assim, retomada da ofensiva das classes dominadas na luta de classes.
Repitamos, portanto, o grande Galileu: Eppur si muove!!!
Fred