“O Que do Que Fazer?”, de Louis Althusser, e a relação entre os comunistas e as massas
Cem Flores
“Que Fazer?” é o título de um livro inédito de Althusser, redigido em 1978 e publicado apenas em setembro de 2018. Seu primeiro capítulo, “O ‘Que’ de ‘Que Fazer?’”, o mais relevante para nós, foi traduzido e oferecido em fevereiro de 2019 aos camaradas e leitores do Cem Flores. À época, dissemos:
“encontramos no texto uma rica discussão sobre métodos de pesquisas para os militantes diante e sobre as massas em uma determinada conjuntura. Discussão que também é uma polêmica política, pois o elo com as massas é um fator político fundamental de qualquer política revolucionária, junto de uma análise concreta da situação concreta. Então, conhecer as massas, saber conectar-se com elas, combater as distâncias entre os militantes e elas, efetivar de forma coerente a luta ideológica etc. dizem do fundamento de uma linha política justa”.
Tendo em vista a importância desse tema para nossa conjuntura de profunda crise e de necessidade de reconstrução do movimento comunista aos níveis nacional e internacional, achamos importante uma análise mais profunda sobre o texto de Althusser, que organizamos a partir de teses marxista-leninistas desenvolvidas pelo autor: o primado da linha política, da contradição e das massas.
1 – Primado da linha política
Que fazer? A pergunta militante de Lenin nos anos 1901 e 1902, nos primórdios da organização revolucionária do proletariado na Rússia, lembra Althusser, é uma pergunta política de mais alto valor para os comunistas. Na prática, a pergunta se desdobra da seguinte forma:
“Que fazer para ajudar a orientação e a organização da luta de classe operária e popular, para que ela prevaleça contra a luta de classe burguesa?”.
Ou seja, como construir uma direção comunista através e dentro da luta de massas, das lutas da classe operária e demais dominados contra a burguesia? Como essa direção comunista construída dentro das massas pode intervir na luta das massas (na luta de classes)? Em suma, como alcançar a revolução, o socialismo?
Lenin apresentou um conjunto de respostas concretas, precisas, específicas àquela conjuntura. Decisões e escolhas que surgiram através da polêmica política e da experiência prática e se dirigiram para uma determinada organização, seus militantes e ações. Tais respostas
“constituem entre si todo um sistema, por um lado, de princípios de teoria, de orientação, de organização e de ação (para uma luta de “longa duração”), e, por outro, as palavras de ordem correspondentes (para a ação imediata).”
Esse sistema forma, em suma, uma linha política. A pergunta leninista expõe, segundo Althusser, a precedência da linha política sobre a organização política. Esta, suas táticas e estratégias, dependem e se desdobram da linha política, estão subordinadas a ela. Assim como suas palavras de ordem e ações mais imediatas. Todas elas se relacionam a esse fundamento, a essa “linha de longa duração”. Eis a razão do primado da linha política.
Tal linha possui uma “dimensão de futuro”, de orientação geral, e consolida “os meios teóricos, organizacionais, ideológicos e práticos necessários a realizar, na luta, essa ‘linha’.”.
Responder à pergunta que fazer?, assim, para os comunistas, não é algo banal. Trata-se de constituir sua linha política, cujos efeitos organizacionais e práticos são fundamentais. Uma linha errada conduzirá a estratégias, táticas, palavras de ordem e ações cotidianas erradas, encaminhando toda uma organização para a derrota. Ou então, não conseguirá se efetivar enquanto tal, ficando a organização sem fundamento – mais precisamente, num contexto de luta de classes, abrirá flancos para a predominância de uma linha burguesa, o oposto do pretendido.
A linha política não é um ato de criação individual e aleatória, a partir da cabeça genial de um ou de outro dirigente: ela surge através e dentro da luta de classes, a serviço dela. A pergunta que fazer?, Lenin tomou dos militantes, da prática política e teórica, e refletiu-a com e através deles sob e para uma determinada conjuntura.
Assim, é preciso reafirmar, a linha política é uma linha de classe, em luta, relacionada com uma realidade concreta. No entanto, eis aí mais um problema. Além de decidir os atos a se realizar e sob qual linha, na luta, é preciso saber que realidade é essa na qual se desenvolve essa luta. Realidade que sempre é efeito de múltiplas determinações e características específicas.
Sem uma análise concreta da situação concreta (como diria Lenin, formulação essa que é a alma viva do marxismo), a linha política pode perder sua justeza, sua relação efetiva e coerente com a luta de classes. Sem tal análise, erra-se na linha política. Novamente, seus efeitos práticos e imediatos são inescapáveis, e, dizia Althusser à época, vários comunistas estavam presos a esses efeitos nefastos (e continuam a estar, diríamos):
“É uma ilusão crer que uma palavra de ordem, mesmo “tirada” dessa linha política formalmente justa, vá poder, por milagre, fazer o trabalho da “linha política” em seu lugar. Com o que, no limite, uma palavra de ordem pode ser falsa, mesmo se ela tiver sido tirada de uma linha formalmente justa. Essa é, evidentemente, uma situação limite, na qual a direção de um sindicato ou de um partido não fez seu trabalho de “análise concreta da situação concreta”, ou só o fez pela metade, de longe e de cima, em nome de uma “teoria” vaga que ela se contenta em aplicar. Esse é atualmente o caso do PCF e de vários partidos comunistas”.
Por isso a pergunta que fazer?, que funda uma linha política, está imbuída de outras perguntas: o que é/como está a luta de classes? Apenas respondendo também essas perguntas, de fundo teórico mais evidente, se poderá definir o que fazer nessa/dessa contradição concretamente, ou seja, sobre determinações específicas, sob a posição de uma determinada classe.
2 – Primado da contradição, da luta de classes sobre as classes
“Tudo depende, portanto, da “análise concreta da situação concreta” da tendência atual da luta de classe operária e popular em seu antagonismo com a luta de classe burguesa”.
Para os comunistas, conhecimento da realidade concreta é conhecimento das condições da luta de classes operária e popular contra a luta de classes burguesa. Aqui, diz Althusser:
“não podemos […] nos dispensar de ir “a campo” e de analisar as coisas até os menores detalhes. […] O que se passa no detalhe das condições de vida, de trabalho, de exploração de um trabalhador da metalurgia, da petroquímica, da agricultura “familiar” ou industrial, de um ferroviário, de um empregado de banco, da seguridade social, etc.?”.
Mas isso é apenas uma parte desse trabalho. A análise concreta da situação concreta é a análise desse antagonismo, e não um “raio X” de cada classe, isolada do seu contexto, de sua luta contra as demais classes. Tal contradição, a luta de classes, segundo o autor, determina e condiciona as características de ambas as classes; constitui as classes, que, portanto, não são algo independente/exógeno nem pré-existente em relação à luta de classes.
“Caso contrário, caímos na “sociologia vulgar”, caso contrário analisaremos a classe burguesa de um lado e a classe operária de outro lado, acreditando que chegaremos a lhes conhecer separadamente. É como se acreditássemos conhecer uma partida de futebol “analisando” a composição das equipes, e não analisando seu confronto, sem o qual não haverá nenhuma equipe de futebol no mundo”.
Essa análise concreta da situação concreta só pode ser, em última instância, análise das condições do antagonismo fundamental da sociedade capitalista. A ênfase no antagonismo, na contradição, e seu primado em relação aos contrários, por isso, se faz essencial:
“[…] antagonismo que constitui de uma só vez a classe burguesa em classe dominante e exploradora, e a classe operária em classe dominada e explorada”; “a luta de classes como o que constitui as classes ao dividi-las em classes”.
Uma análise concreta também não pode ser feita “espontaneamente” sem fundamentação teórica específica. Ou seja, sem um desvencilhar-se da ideologia dominante, a partir da posse e do uso do marxismo. Diz Althusser: “Uma análise concreta e a teoria marxista […] são uma única e mesma coisa.”
Nem essa análise surge apenas da teoria, de sua derivação lógica ou sua “aplicação” simplista à realidade concreta, matando assim a “alma viva” do marxismo:
“A teoria marxista não pode pretender deter de antemão a verdade sobre seu objeto, pois seu objeto é, em essência, “histórico”, ela não pode conhecê-lo de antemão, ela não pode conhecê-lo a não ser submetendo-se, a si própria, ao caráter histórico do seu objeto, se atribuindo, a si mesma, como teoria, um caráter histórico que lhe permita não apenas não trair seu objeto pela pretensão de ser de antemão a verdade absoluta, mas de lhe compreender verdadeiramente prevenindo-se desse perigo”.
Em outra passagem, Althusser complementa:
“a via que não deve ser seguida: a da simples aplicação ao concreto de uma teoria, eu não digo apenas de uma teoria falsa ou falsificada em princípio, mas de uma teoria em geral, incluindo uma teoria verdadeira. Se vocês pegarem a teoria marxista, suposta verdadeira, e vocês decidirem aplicá-la ao concreto e esperarem dessa ‘aplicação’ a produção da própria verdade do concreto, vocês podem ficar esperando”.
Mas, quais são as condições políticas desse conhecimento? De novo, não se trata de um ato isolado, nesse caso, de intelectuais. Mas de um ato na luta de classes. O próprio surgimento da teoria marxista o foi, enquanto sistematização da posição proletária no campo da teoria. Como diz Balibar, em seu livro Cinco estudos do materialismo histórico (Editorial Presença, 1975):
“Pode dizer-se que [o marxismo] não só institui uma teoria para o proletariado, que lhe explica a sua situação histórica e lhe dá as armas de que ele necessita para a transformar, como institui uma teoria do proletariado, que, pela primeira vez na história, permite ao proletariado (e geralmente aos trabalhadores explorados) existir também, como classe autônoma, no terreno da teoria”.
Veremos na próxima parte a dinâmica dessa luta ideológica e teórica para a realização dessa análise concreta assim como pela difusão da linha política que surge dessa análise, para e com as massas.
3 – Primado das massas
O primado das massas sobre a vanguarda parece contradizer os dois primados anteriores. Ora, a burguesia não só explora o operário, mas também o domina ideologicamente, assim como o restante da massa, através de inúmeros mecanismos e aparelhos. As ideias dominantes são as ideias da classe dominante, dizia Marx no Manifesto. Vimos inclusive que, por isso, a análise concreta da realidade concreta não pode ocorrer espontaneamente. Então como é que as massas podem possuir o primado?
Estamos diante talvez do aspecto mais rico desse texto de Althusser: os paradoxos e os meandros da luta ideológica no seio das massas, as contradições entre vanguarda e massas e os desafios políticos que daí emergem.
Pois bem, como dissemos acima, Althusser afirma que não podemos dispensar a “ida ao campo” para conhecer os detalhes da vida dos trabalhadores e de sua luta; para realizar a análise concreta da realidade concreta. Porém, quando estamos a ouvir as massas espontaneamente não temos uma análise concreta pronta. Temos sim um “material” para essa análise.
Isso porque, um primeiro limite das respostas é que os trabalhadores diante de uma enquete e “entrevista” formal e superficial certamente falarão o que se quer ouvir. E calarão muito do que sabem, ou do que imaginam não saber mas sabem. Ou seja, é preciso estar atento e se preparar para o manuseio desse “material”.
Em segundo lugar, os trabalhadores espontaneamente tendem a possuir um maior ou menor conhecimento de sua situação, de sua empresa, de seu ramo… Não à toa: é onde sua luta ocorre de forma direta e cotidiana. Mas dificilmente ultrapassam esse nível. E Althusser traz o exemplo dos operários da Alfa Romeo, uma categoria de vanguarda à época.
“Se eles sabem o que se passa na sua fábrica e no seu truste, eles não têm nenhuma ideia comparável do que se passa realmente na Fiat, portanto no mesmo ramo de produção, e absolutamente nenhuma ideia do que se passa nos outros ramos da produção nacional, a metalurgia, o têxtil, a petroquímica, as minas, a agricultura, os transportes, os trustes de distribuição e a finança, etc. Portanto, é absolutamente impossível de se ter uma ideia do que determina o que se passa na Alfa Romeo se não temos uma ideia tão completa quanto possível sobre a posição da Alfa Romeo não somente na produção e no mercado automobilístico, mas também na metalurgia, nos têxteis, na indústria de plásticos, na petroquímica, na borracha – indústrias que interessam diretamente a produção de automóveis, posto que elas lhe fornecem seus produtos finais, como matéria prima para a construção de veículos. E é absolutamente impossível de compreender o que determina a existência e a importância da produção automotiva na produção nacional se não compreendemos o lugar definido que ocupa a produção automotiva no conjunto da produção econômica, quer dizer no conjunto de ramos existentes. Esse próprio lugar não pode ser compreendido a não ser que consideremos em conjunto a concorrência de capitais à busca da taxa de lucro máxima, que explica que o capital se investe no setor automotivo (em vez de em outros), e o lugar desse investimento no conjunto da estratégia econômica da burguesia, que é inseparável da luta de classes burguesa”.
E aqui Althusser faz uma interessante digressão sobre como a produção em massa de automóveis, os novos formatos urbanos possuem uma relação direta com a luta de classes, com a necessidade concreta da burguesia de erradicar as vilas e bairros operários, distribuir os trabalhadores pela periferia das cidades, criar sistema de transporte (coletivo e individual) para ele poder ir trabalhar; livrando o capital dos custos fixos com moradia, escola, igreja, etc., e, principalmente, dos riscos dessa dupla concentração (moradia e local de trabalho) sobre a revolta operária.
Mas o caso dos trabalhadores da Alfa Romeo demonstra a existência de bloqueios ideológicos, e não apenas “falta de conhecimento”, que impedem de realizar perguntas e respostas sobre um patamar que foge à vivência cotidiana e sua luta particular. Isso porque está ausente a dimensão da teoria. “Não há análise concreta da situação concreta sem um mínimo de matriz da teoria marxista”. Ou, como vimos acima (e Althusser não ressalta esse ponto), esse caso nos mostra que a luta de classes no terreno ideológico e teórico não foi levada ao ponto de constituição do marxismo, da análise concreta da realidade concreta. As condições políticas desse conhecimento estão apenas latentes.
Sem essas condições, é impossível compreender:
“esse sistema [que] abrange hoje até o mercado mundial de capitais e as multinacionais, sua ‘política’ de deslocamento dos investimentos em função da mão de obra a mais mal paga, de pesquisa e conquista de fontes de matérias primas e das flutuações dos seus preços, a ‘situação política’ inquietante ou tranquilizadora de tal país, etc. Para compreender o lugar que ocupa tal processo de trabalho no qual está engajado tal operário em tal ramo, é preciso, ao menos nos seus grandes traços, compreender o mecanismo desse sistema”.
Assim, cabem aos comunistas realizar um trabalho teórico e político sobre esse “material” bruto, saber relacionar o que foi dito e o que não foi dito – e por que.
Mas, sobretudo, “estar disposto a aprender o que ele não sabe e que o trabalhador sabe, mas sem saber que ele o sabe, e que ele acaba dizendo, mas de forma torta, enviesada, e até nas suas omissões e silêncios.”. Ou, como o autor diz, realizar uma escuta justa, considerando que o próprio trabalhador é, acima de tudo, um campo de batalha ideológica:
“Pois ele é o lugar onde se confrontam as ideologias complexas até dentro de seus corpos, e cujo antagonismo é “naturalmente” encoberto para ele: o Estado e todo seu sistema ideológico geral, e o capitalista e todo seu sistema ideológico para uso interno, lhe propõem constantemente “ideias” pelas quais ele pode se reconhecer, “ideias” sobre o salário como preço do trabalho, sobre a promoção social, sobre a participação, sobre a livre divisão de tarefas, sobre a diferença entre a economia (a produção) e a política, sobre os valores morais que ele deve incorporar se ele quiser ser um bom pai de família, sobre a escola que garantirá o futuro dos seus filhos, isso quando não é a Igreja, a que os batiza, lhes catequisa, e lhes fala, como fala a ele, da vida eterna como recompensa dos sofrimentos deste mundo. Esse impressionante sistema de sistemas, que não é nem formal nem formalizável (o marxismo nada tem a ver com a “teoria dos sistemas”, que representa hoje a vanguarda da luta ideológica de classe do imperialismo), possui muita força de intimidação e, às vezes, atrativos compensatórios para fazer esquecer ao operário que ele não é mais do que o apêndice da máquina, quer dizer, o explorado do capitalismo. Mas o operário também tem sob seus olhos a condição real feita em relação a ele, e por pouco que ele se revolte e que sua revolta seja iluminada pela luta organizada, em seguida lhe veem outras ideias: aquelas que denunciam as primeiras como mistificações, aquelas que lhe falam da realidade da luta de classes e da necessidade de se unir para mudar suas condições de trabalho e essa sociedade que as engendra sem cessar”.
Ou seja, o primado das massas é o reconhecimento não só que a linha política, a organização e suas práticas dependem e surgem da “luta de classe operária e popular” assim como visam retornar a essa. Ou que os comunistas realizam a análise concreta da situação concreta para se integrar e buscar dirigir essa luta com as massas. É também reconhecer que, embora dispersa, a ideologia proletária existe e está em luta nas massas, ideologia e saber que os comunistas possuem o papel de sistematizar, teórica e politicamente, para intervir nessa luta. Reconhecer que a ideologia se funda também em um antagonismo, em luta, que precisa ser organizada e difundida a nível das massas.
E é dessa dimensão crucial das massas que os militantes não devem e não podem se afastar. Althusser aponta o risco e o paradoxo da própria organização “cegar” e fixar o militante a certa análise parcial da realidade, uma ideologia que se veste como saber absoluto, portanto arrogante. Ora isso nos parece um dos efeitos reais de muitos aparelhos sindicais e partidários, ou de movimentos sociais, que se colocam em uma posição “superior”, professoral, não levando em conta a complexidade da luta ideológica e o fato de poder “acontecer que os trabalhadores que não pretendem possuir nenhuma ‘consciência’ particular, apenas porque eles não fazem parte de nenhum sindicato nem de nenhuma organização política, sabem verdadeiramente muito mais do que eles pensam saber”.
Finaliza Althusser:
“é sobre esse[s] paradoxo[s] que está baseado na tradição marxista o primado das massas sobre as classes, e o primado das massas e as classes sobre as organizações de luta [de]classes, sobre o sindicato e sobre o partido. Não se trata de maneira nenhuma de cair no culto das massas, mas de ser extremamente atento ao grau de consciência dos operários, sabendo que seu grau de consciência e, a fortiori, de conhecimento não corresponde necessariamente ao grau que eles acreditam ter alcançado, portanto à sua consciência de si. Pelo primado das massas sobre as classes, das massas e das classes sobre o sindicato e sobre o partido, a tradição marxista também quer dizer mais outras coisas mais, mas no ponto que estamos tratando, ela designa, na forma de uma advertência ao bom entendedor, para o qual meia palavra basta, o simples fato que os trabalhadores não escapam à luta ideológica, portanto, à dominação da ideologia dominante, e que toda forma de consciência sindical ou política é constantemente ameaçada de ser tomada pela verdade acabada, a menos de reconhecer que os operários não organizados, portanto em princípio menos conscientes, podem saber, no seu silêncio, muito mais que aqueles que falam um pouco rápido demais em seu nome”.
Esse primado das massas, agora podemos ver, está sim em concordância com o caráter científico do marxismo, que não é um saber absoluto, com a necessidade de acompanhar a mudança da realidade e sua complexidade. Da mesma forma, está em concordância com o fato da luta das massas, operária e popular, ser um fator objetivo e anterior à própria pergunta que fazer.
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Por fim, uma breve recapitulação: responder à pergunta que fazer?, pergunta que deve fundar a atuação militante revolucionária, é instaurar uma linha política, fundamento de uma organização e prática política. A linha política justa não é externa à luta de classes e suas condições concretas. É já uma ação nessa luta, enquanto efeito de uma análise concreta dessa própria luta – o que pressupõe uma luta ideológica e teórica sob a posição proletária, o exercício do marxismo, com e para as massas.
O partido, a direção comunista, portanto, é ao mesmo tempo expressão e síntese, instrumento e organizador da linha política da classe operária contra a burguesia.