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Os pacotes de Biden e as ilusões do oportunismo

Nota política conjunta do Bandeira Vermelha e do Cem Flores

21.05.2021

O novo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, do partido democrata – um dos dois partidos burgueses que se dividem na gestão da principal potência imperialista do mundo –, em breve completará 4 meses de governo. Uma das principais medidas desse período foi o anúncio de três grandes pacotes econômicos: um plano de resgate para combater impactos da pandemia; outro focado em infraestrutura e inovação tecnológica; um terceiro visando criação de empregos e políticas sociais. Ao todo, esses pacotes, se implementados, atingem por volta de 6 trilhões de dólares, a serem gastos em até 10 anos. Segundo o governo, uma parte desses pacotes será financiada por um aumento de impostos sobre ganhos de capital – em até 15 anos!

A forte propaganda dessas medidas se soma à mudança de postura e de discurso desse novo governo, comparado ao ex-presidente Trump, sobre o meio ambiente, a pandemia, os imigrantes, os sindicatos, os negros… O aplauso na “esquerda” de todo o mundo tem sido crescente. Reformistas e oportunistas de todo o canto veem as políticas de Biden como uma alternativa governamental para a grave crise de crescimento pela qual passa o capital, para reduzir as “desigualdades sociais” inerentes ao capitalismo e a forma possível para combater os governos e movimentos de extrema direita. Buscam agora construir candidatos que se escorem na imagem de Biden.

A análise concreta da realidade concreta sobre tais políticas não deixa espaço para ilusões: tratam-se de políticas burguesas, em prol do fortalecimento dos EUA como potência imperialista e que visam travar o seu declínio, que em nada servem à autonomia, força e organização do proletariado e demais dominados/as. Por essa razão, à posição comunista, à classe operária, não cabe cair em mais uma ilusão dos gestores da maior potência imperialista, mas sim apontar o caminho revolucionário para a saída da crise imperialista que vem piorando a vida das massas ano após ano.

Longe de ser uma “bondosa” política de Biden, pró-meio ambiente, pró-setores das classes trabalhadoras mais explorados etc., os pacotes são uma resposta dos capitais e do Estado ianque. De modo geral, respondem ao agravamento de contradições internas e externas ao país. Internas, por conta da violenta pandemia, da maior crise econômica desde a década de 1930, do baque sofrido pelo mercado de trabalho, e da revolta popular e crise política que atravessou o país ano passado. Externas, por conta da redução contínua do peso relativo do imperialismo norte-americano no mundo e, principalmente, da concomitante ascensão do imperialismo chinês nas dimensões econômica, política, militar, tecnológica e ideológica, mas também dos seus rivais Russo e União Europeia. A reprodução do imperialismo ianque, de forma cada vez mais intensa, necessita responder a essas contradições. E isso tem sido feito, apesar das diferenças ideológicas, desde Trump – com o maior conflito com a China (mantido por Biden), a elevação de gastos estatais etc.

Biden e seus pacotes e mudanças de postura visam, e nisto não se distingue de qualquer outro presidente norte-americano, Trump incluído, governar para/com/pelos monopólios, em prol da elevação da taxa de lucro, da dominação de classe burguesa. E para atingir esse objetivo, utilizar intensamente o Estado para minimizar os efeitos da crise e da pandemia, manter e ampliar programas emergenciais de renda (iniciados com Trump); alterar tributações; gerar impacto político-ideológico na luta de classes interna, reestabelecendo apoio nas bases de trabalhadores/as, arrefecendo o movimento negro, institucionalizando lutas sindicais etc. Especificamente, as medidas “populares” visam também esvaziar a base social de Trump, constituída em grande parte por trabalhadores e pequenos proprietários arruinados, hoje atraídos por demagogos populistas e fascistas. Com razão, Biden e o grande capital que o apoia, percebem que se nada for feito para contrariar esta atracção pela demagogia nacional-chauvinista e racista, para travar o empobrecimento extremo dessas camadas de desempregados, falidos, precários e marginalizados do “sonho americano”, a situação social nos EUA pode tornar-se ainda mais explosiva.

Externamente, a administração Biden persegue os mesmos objectivos de Trump, só que de maneira diferente. Enquanto Trump via no fechamento do mercado dos EUA às multinacionais dos países imperialistas concorrentes (principalmente nas áreas das tecnologias digitais e informáticas, aeronáutica, indústrias de automóvel e agroalimentar) proibindo as relações económicas e comerciais com eles, impondo sanções e taxas alfandegárias, por exemplo, Biden busca melhorar as condições de acumulação de capital – aumento de produtividade, novas tecnologias, reforço de liderança política/ideológica, em combate direto com seu principal rival, a China, mas sem desprezar os outros, regressando ao que tem sido a doutrina tradicional norte-americana em política externa. Um programa que busca reorganizar seu campo, refazendo alianças e compromissos rasgados por Trump, notadamente os militares (NATO), geoestratégicos (Europa, médio oriente e sudeste asiático) e ambientais, para se posicionar em melhores condições nos conflitos interimperialistas, principalmente contra a China, a Rússia e, também, a União Europeia.

Biden é chefe de um governo burguês imperial; os EUA, a principal potência imperialista. Não são aliados dos/as trabalhadores/as em sua resistência concreta contra a piora nas condições de vida e trabalho na crise. O que Biden quer passar como bondade, na realidade são, de um lado, conquistas arrancadas pelos protestos das massas em 2020, de outro uma tentativa de cooptá-los e controlá-los, em prol da estabilidade política para uma nova rodada de exploração e ofensiva burguesa. Não foram ilusões semelhantes as que os seus comparsas Obama ou Clinton semearam? A exploração da força de trabalho só faz aumentar, os assassinatos do povo negro continuam, as intervenções imperialistas também… mais uma vez, tudo sob o manto de um governo “democrata” e “progressista”.

Se não foram governos burgueses anteriores que resolveram os problemas das classes trabalhadoras, Biden também não será. Ainda mais diante das enormes contradições do imperialismo hoje. Junto às migalhas (temporárias) arrancadas do governo, há o constante estímulo à exploração e inovação tecnológica que cada vez mais descarta trabalhadores/as. O racismo, a extrema-direita, continuarão a persistir, frutos de uma sociedade mergulhada cada vez mais na barbárie, cansada das ilusões de reformas e melhorias parciais, e sob a necessidade de aumento constante da repressão sobre as massas. Para o capital tentar sair da crise e travar o seu declínio, necessita aprofundar ainda mais a exploração capitalista, uma ofensiva burguesa ainda mais forte. As gigantescas contradições da crise do imperialismo, que não consegue contrariar a fuga interminável do capital da esfera produtiva para o da especulação financeira nem a deslocalização da produção para onde a mão-de-obra seja mais barata, não podem ser resolvidas pela expansão do endividamento estatal.

A única resposta a mais uma crise do capital, ao aumento do fascismo em todo o mundo, é uma resposta revolucionária pelo derrube do capitalismo e a instauração de um sistema económico e social comunista onde não haja a exploração de classes, uma resposta construída desde as menores lutas dos trabalhadores e das trabalhadoras, na retomada da posição independente de classe, contra as ilusões de sempre do reformismo. Sem ilusões, o lugar dos comunistas é com as massas exploradas dos EUA e de todos os países, e não numa suposta gestão menos pior do Estado da classe que vive do suor e sangue do proletariado.

Maio de 2021

Bandeira Vermelha

Cem Flores

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- 21/05/2021