CEM FLORES

QUE CEM FLORES DESABROCHEM! QUE CEM ESCOLAS RIVALIZEM!

Conjuntura, Destaque, Imperialismo, Internacional

A Guerra na Ucrânia é uma guerra entre potências imperialistas! A guerra dos comunistas é contra o imperialismo!

Cem Flores

02.03.2022

A guerra na Ucrânia é a expressão mais clara hoje do aprofundamento das contradições interimperialistas e de sua tendência à guerra. Movidos por seus interesses econômicos e políticos expansionistas, acirrados com o aprofundamento da crise geral do imperialismo desde 2008, Estados Unidos e União Europeia, com a OTAN como instrumento, avançam sobre os países do leste europeu. Tentando frear essa ofensiva, a Rússia partiu para o ataque na disputa dessa região de grande importância geoestratégica. Mais uma vez, portanto, o mundo assiste potências imperialistas em guerra, batalhando pela conquista/manutenção de suas áreas de interesse.

Ainda antes do início do conflito armado, o Cem Flores e o Bandeira Vermelha publicaram uma nota conjunta afirmando essa posição e apontando claramente que não cabe aos comunistas optar pelo bloco imperialista “menos pior” (como se fosse possível estabelecer essa medida!). Defendemos claramente que:

a posição comunista deve levantar bem alto sua bandeira contra as guerras imperialistas, levantar a bandeira pela destruição desse sistema que nos leva novamente à sombra de uma guerra mundial. Nem um dos lados nessa contenda expressa a posição proletária e nem o interesse de seus povos. São representantes de seus monopólios, de seus capitais e nos querem como bucha de canhão para seus interesses.

Posição semelhante, em relação a essa questão específica, assumiram dezenas de organizações comunistas e operárias em todo o mundo, que assinaram uma Declaração Conjunta: Não à Guerra Imperialista na Ucrânia. As posições do Partido Comunista da Grécia (KKE), dos Partidos Comunistas da Suécia e da Finlândia, do Partido Comunista Operário Russo, do Partido Comunista da Turquia, entre outros, denunciando a guerra imperialista e defendendo o socialismo como a única alternativa ao proletariado e aos povos, podem ser acessadas nos links indicados.

Para uma compreensão mais aprofundada da crise do imperialismo nos dias atuais e sua tendência à guerra indicamos a recente análise do Cem Flores sobre a Conjuntura Internacional no Começo de 2022: Agravamento das contradições interimperialistas, guerra e aumento da exploração e da miséria das massas trabalhadoras.

Com o mesmo objetivo de aprofundar a compreensão do conflito na Ucrânia, do ponto de vista do proletariado revolucionário, reproduzimos abaixo texto de Nikos Mottas, que resgata o leninismo para a compreensão desse confronto. A tradução publicada no Lavra Palavra é de Marcelo Bamonte.

 

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Uma abordagem leninista ao confronto inter-imperialista na Ucrânia

Nikos Mottas

“A classe operária”, sublinhava V. I. Lênin, “se for consciente, não apoiará nenhum grupo de predadores imperialistas”. [1] Mais especificamente, no que diz respeito à postura do movimento operário em relação aos imperialistas, ele estava usando o seguinte exemplo característico:

“Um país, digamos, possui três quartos da África, enquanto outro possui um quarto. Uma repartição da África é o conteúdo objetivo de sua guerra. De que lado devemos desejar o sucesso? Seria absurdo colocar o problema em sua forma anterior, já que não possuímos os velhos critérios de avaliação: não há nem um movimento de libertação burguês de décadas, nem um longo processo de decadência do feudalismo. Não é tarefa da democracia atual ajudar o primeiro país a afirmar seu ‘direito’ a três quartos da África, ou ajudar o último país (mesmo que esteja se desenvolvendo economicamente mais rapidamente do que o primeiro) a tomar esses três quartos. A democracia atual só permanecerá fiel a si mesma se não unir nem a uma nem a outra burguesia imperialista, apenas se disser que os dois lados são igualmente maus e se desejar a derrota da burguesia imperialista em todos os países. Qualquer outra decisão será, na realidade, nacional-liberal e não terá nada em comum com o internacionalismo genuíno. […] Na realidade, não se pode falar agora da democracia atual seguindo o rastro da burguesia imperialista reacionária, não importa qual seja a ‘tonalidade’ desta última”. [2]

O legado leninista sobre a postura da classe trabalhadora em uma guerra imperialista foi e continua sendo extremamente relevante. Especialmente em nossos dias, quando os tambores da guerra estão batendo cada vez mais alto na Ucrânia. Está provado que a guerra é a continuação da política por outros meios violentos e militares, e é preparada através do confronto feroz de interesses concorrentes da classe burguesa e dos governos que a servem.

Com base nessa posição, Lênin rejeitou “a concepção ignorante do homem comum da guerra como algo à parte das políticas dos governos e das classes envolvidas, como sendo um simples ataque que perturba a paz, e então é seguida do restabelecimento da paz assim perturbada, chegando a dizer: ‘Eles brigaram, depois fizeram as pazes!’” E sublinhava que “a guerra é uma continuação da política por outros meios. Todas as guerras são inseparáveis ​​dos sistemas políticos que as engendram. A política que um determinado Estado, uma determinada classe dentro desse Estado, perseguiu por muito tempo antes da guerra é inevitavelmente continuada por essa mesma classe durante a guerra, mudando apenas a forma de ação”. [3]

Mas por que mencionamos todos os itens acima? Por ocasião da rápida intensificação da rivalidade inter-imperialista entre as forças euro-atlânticas (EUA, OTAN, UE) e a Rússia na Ucrânia, uma série de ideologias enganosas e falaciosas vêm à tona que chamam os trabalhadores a fazer uma escolha e apoiar um ou outro lado. Na Grécia, por exemplo, Estado-membro da UE e da OTAN, a percepção dominante na mídia burguesa destaca a necessidade de apoiar as forças euro-atlânticas “democráticas” contra o “autoritarismo” de Putin, apostando também no cultivo sistemático da propaganda anti-russa. Por outro lado, os partidários da narrativa pró-russa tentam apresentar a Rússia capitalista de Putin como uma potência “anti-imperialista” e um reduto do “antifascismo” contra a aliança euro-atlântica e os fascistas de Kiev.

Ambas as visões que pedem o apoio a um lado ou a outro são enganosas e, acima de tudo, perigosas para a classe trabalhadora e para o povo. Em poucas palavras, elas conclamam o povo para escolher um imperialista, com base em quem é mais ou menos mau. Mas, existe imperialista bom e ruim? Que interesse tem a classe trabalhadora em ser arrastada sob as bandeiras falsas de um ou outro imperialista?

É preciso entender que, nas últimas duas décadas, o crescimento desigual do capitalismo levou ao surgimento e rápido fortalecimento de novas potências econômicas mundiais, como China e Rússia, que reivindicam uma fatia cada vez maior do mercado internacional. A ascensão econômica dessas potências é inevitavelmente acompanhada pelo aprimoramento de sua força política e militar, levando a rearranjos no “tabuleiro de xadrez” imperialista e ao acirramento das competições com as potências indiscutivelmente dominantes, como os EUA e UE. Este acirramento da concorrência imperialista está se manifestando hoje na Ucrânia e na Europa Oriental.

Na Ucrânia e na região mais ampla da Europa Oriental, o oponente inspirador das potências belicistas euro-atlânticas (EUA, OTAN, UE) é a Rússia capitalista. Devemos sempre ter em mente que não é a União Soviética, mas um país com um conteúdo social e de classe completamente diferente. A percepção de que a Rússia não é uma potência imperialista, mas apenas um país capitalista na “periferia” do sistema imperialista que, ao lado da “China socialista” (sic!), exerce um efeito positivo na política internacional é totalmente equivocada. Tal abordagem está em oposição direta ao conceito leninista de imperialismo, na medida em que separa a política da economia.

Da mesma forma, aqueles que tentam “vestir” a Rússia capitalista de hoje com elementos que caracterizaram a União Soviética (antifascista, anti-imperialista, progressista) contribuem para a desorientação e manipulação do movimento operário, especialmente em períodos de intensificação da concorrência imperialista. A menos que eles queiram nos convencer de que o presidente Putin é uma espécie de “Stálin” do século 21 que, ao lado de Shoygu no papel de “Júkov” e Lavrov como “Molotov”, estão tentando salvar a humanidade dos nazistas modernos.

Deve-se entender que, na era do imperialismo, não pode haver Estados capitalistas pacíficos. E se no início de uma guerra a diferença entre o Estado burguês atacante e o Estado burguês defensor é talvez relativa, a questão importante em qualquer guerra é uma: qual classe conduz a guerra, com que propósito e em que estágio do desenvolvimento histórico.

Em sua obra Socialismo e guerra, Lênin escrevia:

“Imaginem um proprietário de escravos que possuía 100 escravos guerreando contra um proprietário de escravos que possuía 200 escravos, por uma distribuição mais ‘justa’ de escravos. Claramente, a aplicação do termo guerra ‘defensiva’ ou guerra ‘pela defesa da pátria’ em tal caso seria historicamente falsa e, na prática, seria puro engano das pessoas comuns, dos filisteus, dos ignorantes, pelos astutos donos de escravos. Precisamente assim a burguesia imperialista atual engana os povos por meio da ‘ideologia nacional’ e do termo ‘defesa da pátria’ na presente guerra entre senhores de escravos para fortalecer e reforçar a escravidão”. [4] O exemplo acima pode servir como um retrato para o conflito inter-imperialista de hoje entre EUA-OTAN-UE e Rússia na Ucrânia.

O movimento comunista e operário deve formar uma frente implacável e firme contra os planos imperialistas criminosos das potências euro-atlânticas (EUA, OTAN, UE). No entanto, ao mesmo tempo, não deve ficar do lado de nenhum outro Estado capitalista (Rússia) ou aliança imperialista (China-Rússia) escolhendo bandeiras que são estranhas aos seus interesses. O povo trabalhador não deve derramar seu sangue pelos interesses de nenhum imperialista (mais ou menos poderoso, americano ou russo, europeu ou chinês).

Ao contrário, o movimento operário-popular na Grécia e em qualquer outro país deve traçar uma linha independente, em um caminho de confronto e ruptura com os interesses burgueses e imperialistas, tendo como único critério os interesses da classe trabalhadora e das camadas populares. Na era do imperialismo, a única guerra justificada é a guerra revolucionária de classes, pela conquista do poder pelo proletariado e seus aliados.

Hoje, as palavras de Lênin são mais atuais do que nunca: “Só uma revolução comunista proletária pode tirar a humanidade do impasse criado pelo imperialismo e pelas guerras imperialistas. Não importam quais as dificuldades que a revolução possa encontrar e apesar do fracasso temporário das ondas de contrarrevolução, a vitória final do proletariado é inevitável”. [5]

Referências

(1) Lenin Collected Works, V.27, pp. 335-336.

(2) V. I. Lênin. “Sob uma bandeira falsa”, Lenin Collected Works, Progress Publishers, [197[4]], Moscou, Volume 21, páginas 135-157. https://www.marxists.org/archive/lenin/works/1915/mar/x01.htm. Disponível em português: https://www.marxists.org/portugues/lenin/1915/mes/bandeira.htm.

(3) V.I. Lênin. Guerra e Revolução, Lenin Collected Works, Progress Publishers, 1964, Moscou, Volume 24, páginas 398-421. https://www.marxists.org/archive/lenin/works/1917/may/14.htm

(4) V.I. Lênin Socialismo e Guerra, Capítulo Um. https://www.marxists.org/archive/lenin/works/1915/s-w/ch01.htm. Disponível em português: https://www.marxists.org/portugues/lenin/1915/guerra/index.html.

(5) Programa Político do PCUS, 22 de março de 1919 no Oitavo Congresso do Partido Comunista Russo https://www.marxists.org/history/ussr/government/1919/03/22.htm)


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- 02/03/2022