CEM FLORES

QUE CEM FLORES DESABROCHEM! QUE CEM ESCOLAS RIVALIZEM!

Lênin, Movimento operário, Teoria

Lênin. Marxismo e Reformismo.

Conselho de operários e operárias na fábrica Putilov, Rússia, 1920.

Cem Flores

29.08.2022

O capitalismo é a atual forma de exploração, dominação e repressão das massas trabalhadoras por uma pequena minoria de parasitas, que vivem no luxo, sem trabalhar. Nosso momento histórico é marcado, fundamentalmente, pela luta de classes da burguesia para sugar mais trabalho e riqueza alheios, de um lado, e pela luta de classes do proletariado e das massas dominadas para resistir e por um fim à sua vida de miséria e escravidão, de outro.

A história comprova que há apenas uma forma de vencer essa minoria e avançar para uma sociedade sem classes: a revolução rumo ao socialismo e ao comunismo. Essa revolução é resultado do aumento de organização e independência do proletariado e seus aliados, reforço de sua resistência e conquistas parciais, até a conquista do poder e a transição a outro modo de produção. Para os exploradores, essa revolução significa o fim de sua dominação, o risco maior a ser evitado. E, por isso, lançam mão de todo seu poder e violência, buscando reprimir ou desviar toda ação na luta de classes dos dominados que caminhe para a revolução.

Historicamente, surgiram diversos grupos e correntes políticos e ideológicos nas resistências e lutas das massas trabalhadoras que se colocam contrários à revolução. Na realidade, defendem a continuidade da dominação burguesa, do capitalismo. Isso ocorre por diversas razões: pela corrupção dos dominantes no seio dos dominados; pela ideologia burguesa que penetra e é propagada de diversas formas nas massas; pela presença e influência das camadas médias na luta do proletariado etc. Esses grupos e correntes são, objetivamente, inimigos a serem denunciados e combatidos pelo proletariado, entraves à sua luta e aos seus objetivos.

A esses inimigos em nossas fileiras, o marxismo-leninismo denominou de reformistas, de oportunistas e também de revisionistas. O primeiro termo se refere aos que iludem o proletariado com uma possível emancipação sem revolução, apenas com mudanças graduais, reformas, sob o Estado burguês. O segundo grupo também descarta a revolução e defende descaradamente a subordinação do proletariado à burguesia. No terceiro caso, são aqueles que se dizem comunistas, mas corrompem a posição revolucionária do marxismo-leninismo, proletária, para defender de fato o capitalismo.

Os grandes líderes do proletariado lutaram por toda vida contra essas perigosas correntes na luta pela emancipação das massas exploradas. Um exemplo fundamental é Lênin. Segundo ele, não há revolução possível sem combate às posições burguesas no movimento. Desde sua época, essas correntes “se formaram já em todos os países capitalistas avançados” (hoje, não apenas avançados!) e, por isso, sem uma luta decidida e implacável em toda a linha contra estes partidos — ou grupos, correntes, etc., tanto faz — nem sequer se pode falar de luta contra o imperialismo ou de marxismo ou de movimento operário socialista. Ou, como ele condensou em seu clássico Imperialismo, fase superior do capitalismo: “O maior perigo […] são as pessoas que não querem compreender que a luta contra o imperialismo é uma frase oca e falsa se não for indissoluvelmente ligada à luta contra o oportunismo.

A contradição entre revolucionários e o reformismo, o oportunismo e o revisionismo provém de posições de classes antagônicas. E não pelo fato de os revolucionários buscarem apenas uma solução final, definitiva, enquanto os outros privilegiam melhorias imediatas na vida das massas. Nada mais longe da verdade.

Na realidade, as melhorias possíveis dentro do capitalismo são resultados da luta de classes proletária, dependem da força e organização dessa classe. E o reformismo e o oportunismo não só iludem com essas melhorias, sempre parciais e temporárias, como também limitam, com sua política de subordinação às classes dominantes, a própria extensão da força proletária e, consequentemente, dessas melhorias ainda que sob a escravidão assalariada. Enquanto busca “conciliar” o proletariado e a burguesia, essas correntes desarmam e enfraquecem o polo proletário da luta de classes como um todo – são assim um risco não só à revolução, mas até às próprias melhorias parciais e temporárias.

As grandes reformas que consolidam conquistas dos/as trabalhadores/as, as leis e os “direitos” em prol do proletariado etc. vieram de grandes lutas, revoltas, greves e protestos, enfretamentos diretos com o capital e seu estado, e não através táticas conciliatórias e rebaixadas. E o oposto também é verdade: quanto menos luta e organização o proletariado possui, mais a burguesia parte para a ofensiva e retira conquistas, rebaixa as condições de vida e trabalho das massas.

Eis outra lição de Lênin:

“Somente por tais táticas [revolucionárias] pode-se obter progresso real em matéria de reformas importantes. Isto pode parecer paradoxal, mas a sua verdade é confirmada por toda a história do movimento socialdemocrata internacional. As táticas reformistas são as menos propensas a garantir reformas reais. A maneira mais eficaz de assegurar reformas reais é perseguir as táticas da luta de classes revolucionária. Na verdade, as reformas são conquistadas como resultado da luta de classes revolucionária, como resultado de sua independência, força de massa e firmeza.”

Para defender de fato os interesses do proletariado, dos mais imediatos aos estratégicos, colaborar com sua luta a posição dos revolucionários é a de independência de classe. Essa independência é construída através das lutas concretas, com uma linha política que represente, segundo Lênin, as massas, sirva a elas, “isto é, a libertação das massas do capitalismo” e não a que “representa os interesses de uma minoria, a sua conciliação com o capitalismo”.

No texto que publicamos abaixo, com destaques nossos, Lênin, em 1913, reforça e recapitula essas lições, a partir de uma crítica a uma corrente oportunista recém-expulsa do partido dos revolucionários de sua época, os liquidacionistas (aqueles que buscavam liquidar o partido). Segundo ele,

“o reformismo é um logro burguês dos operários, que permanecerão sempre escravos assalariados, apesar de determinadas melhorias, enquanto existir a dominação do capital […] mesmo quando é inteiramente sincero, transforma-se de fato num instrumento de corrupção burguesa e enfraquecimento dos operários. A experiência de todos os países mostra que, confiando nos reformistas, os operários foram sempre enganados.

Em outro trecho, Lênin reforça:

“quanto mais forte é a influência dos reformistas sobre os operários tanto mais fracos são os operários, tanto mais dependentes da burguesia, tanto mais fácil é para a burguesia reduzir as reformas a nada por meio de diversos subterfúgios. Quanto mais independente e profundo, quanto mais amplo pelos seus objetivos for o movimento operário, quanto mais livre ele for da estreiteza do reformismo, tanto melhor os operários conseguirão consolidar e utilizar as melhorias isoladas.”

Em nossa época de crise do movimento comunista, tais lições se mantêm atuais e fundamentais. Para resistir e reverter a atual ofensiva burguesa em todas as frentes, as massas exploradas precisam afastar e combater o reformismo e o oportunismo reinante nos partidos de “esquerda” e movimentos sindicais e populares. E nesse processo, retomar sua posição própria, sua organização e seus métodos de luta. Ou então continuaremos, ilusão após ilusão, a nos desviar de nosso caminho, nos enfraquecer, não só perante a revolução, mas também diante de nossas bandeiras mais básicas e imediatas.

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Marxismo e Reformismo

Lênin

Os marxistas, diferentemente dos anarquistas, reconhecem a luta por reformas, isto é, por melhorias na situação dos trabalhadores que deixam como antes o poder nas mãos da classe dominante. Mas, ao mesmo tempo, os marxistas travam a luta mais enérgica contra os reformistas, que direta ou indiretamente limitam as aspirações e a atividade da classe operária às reformas. O reformismo é um logro burguês dos operários, que permanecerão sempre escravos assalariados, apesar de determinadas melhorias, enquanto existir a dominação do capital.

A burguesia liberal, dando reformas com uma das mãos, retira-as sempre com a outra, as reduz a nada, utiliza-as para subjugar os operários, para os dividir em diversos grupos, para perpetuar a escravidão assalariada dos trabalhadores. Por isso o reformismo, mesmo quando é inteiramente sincero, transforma-se de fato num instrumento de corrupção burguesa e enfraquecimento dos operários. A experiência de todos os países mostra que, confiando nos reformistas, os operários foram sempre enganados.

Pelo contrário, se os operários assimilaram a doutrina de Marx, isto é, tomaram consciência da inevitabilidade da escravidão assalariada enquanto se conservar a dominação do capital, então não se deixarão enganar por nenhumas reformas burguesas. Compreendendo que, conservando-se o capitalismo, as reformas não podem ser nem sólidas nem sérias, os operários lutam por melhorias e utilizam as melhorias para continuarem uma luta mais tenaz contra a escravidão assalariada. Os reformistas procuram dividir e enganar os operários com esmolas, afastá-los da sua luta de classe. Os operários, conscientes da falsidade do reformismo, utilizam as reformas para desenvolver e alargar a sua luta de classe.

Quanto mais forte é a influência dos reformistas sobre os operários tanto mais fracos são os operários, tanto mais dependentes da burguesia, tanto mais fácil é para a burguesia reduzir as reformas a nada por meio de diversos subterfúgios. Quanto mais independente e profundo, quanto mais amplo pelos seus objetivos for o movimento operário, quanto mais livre ele for da estreiteza do reformismo, tanto melhor os operários conseguirão consolidar e utilizar as melhorias isoladas.

Existem reformistas em todos os países, pois por toda a parte a burguesia procura de um modo ou de outro corromper os operários e fazer deles escravos satisfeitos, que renunciem à ideia de suprimir a escravidão. Na Rússia os reformistas são os liquidacionistas, que renunciam ao nosso passado para adormecer os operários com sonhos acerca de um partido novo, aberto, legal. Recentemente, forçados pelo Sévernaia Pravda (1), os liquidacionistas de Petersburgo começaram a defender-se da acusação de reformismo. É preciso determo-nos atentamente nos seus argumentos para esclarecer devidamente esta questão extraordinariamente importante.

Nós não somos reformistas — escreveram os liquidacionistas de Petersburgo — pois não dissemos que as reformas são tudo, que o objetivo final não é nada; nós dissemos: movimento em direção ao objetivo final; dissemos: através da luta pelas reformas rumo à plenitude das tarefas fixadas.

Vejamos se essa defesa corresponde à verdade.

Primeiro fato. O liquidacionista Sedov, resumindo as declarações de todos os liquidacionistas, escreveu que dos “três pilares” apresentadas pelos marxistas (2), duas delas não são atualmente convenientes para a agitação. Ele deixou a jornada de trabalho de 8 horas, que, teoricamente, é realizável como reforma. Eliminou ou afastou precisamente aquilo que sai do quadro de uma reforma. Por conseguinte, ele caiu no mais evidente oportunismo, praticando justamente a política que se exprime na fórmula segundo a qual o objetivo final não é nada. É precisamente reformismo quando o “objetivo final” (ainda que seja relativamente à democracia) é afastado da agitação.

Segundo fato. A famigerada conferência de agosto (do ano passado) dos liquidacionistas também afasta — num caso especial — as reivindicações não reformistas em vez de as aproximar mais, para o próprio centro da agitação.

Terceiro fato. Negando e minimizando o “velho”, esquivando-se a ele, os liquidacionistas limitam-se desse modo ao reformismo. Na situação atual, é evidente a ligação do reformismo com a negação do “velho”.

Quarto fato. O movimento econômico dos operários suscita o ódio e os ataques dos liquidacionistas (“arrebatamento”, “gesticulação”, etc., etc.) logo que ele se liga a palavras de ordem que saiam dos limites do reformismo.

Que resultado obtemos? Em palavras os liquidacionistas rejeitam o reformismo de princípio, de fato aplicam-no em toda a linha. Por um lado, asseguram-nos que de modo nenhum as reformas são tudo para eles, mas, por outro lado, sempre que na prática os marxistas saem dos limites do reformismo isso provoca ou os ataques ou uma atitude desdenhosa dos liquidacionistas.

Entretanto, os acontecimentos em todos os setores do movimento operário mostram-nos que os marxistas não só não ficaram para trás como, pelo contrário, vão claramente à frente na utilização prática das reformas e da luta por reformas. Considerem-se as eleições para a Duma pela cúria operária, as intervenções dos deputados na Duma e fora da Duma, a criação de jornais operários, a utilização da reforma do seguro, o sindicato dos metalúrgicos como sindicato mais importante, etc., em toda a parte vemos a preponderância dos operários marxistas sobre os liquidacionistas, no domínio do trabalho direto, imediato, “cotidiano”, de agitação, de organização, de luta pelas reformas e pela sua utilização.

Os marxistas trabalham incansavelmente, não perdendo uma única “possibilidade” de reformas e da sua utilização, não reprovando, antes apoiando e desenvolvendo atentamente, qualquer saída dos limites do reformismo tanto na propaganda como na agitação e na ação econômica de massas, etc. Quanto aos liquidacionistas, que se afastaram do marxismo, com os seus ataques contra a própria existência de um todo marxista, com a sua infração da disciplina marxista, com a sua pregação do reformismo e da política operária liberal, apenas desorganizam o movimento operário.

Não se deve esquecer, além disso, que na Rússia o reformismo se apresenta sob uma forma particular, que consiste em identificar as condições fundamentais da situação política da Rússia atual e da Europa atual. Do ponto de vista do liberal, semelhante identificação é legítima, pois o liberal acredita e confessa que “nós temos, graças a Deus, uma constituição”. O liberal exprime os interesses da burguesia quando defende a ideia de que depois de 17 de outubro qualquer saída da democracia para além dos limites do reformismo é uma loucura, um crime, um pecado, etc.

Mas são precisamente essas ideias burguesas que são de fato aplicadas pelos nossos liquidacionistas, que “transferem” constante e sistematicamente para a Rússia (no papel) o “partido aberto”, a “luta pela legalidade”, etc. Por outras palavras, eles, tal como os liberais, pregam a transferência para a Rússia da constituição europeia sem o caminho peculiar que no Ocidente conduziu à criação das constituições e à sua consolidação ao longo de gerações, por vezes mesmo ao longo de séculos. Os liquidacionistas e os liberais querem, como se costuma dizer, lavar a pele sem a meter na água.

Na Europa, o reformismo significa de fato a rejeição do marxismo e a sua substituição pela “política social” burguesa. No nosso país, o reformismo dos liquidacionistas não significa apenas isso, mas também a destruição da organização marxista e a rejeição das tarefas democráticas da classe operária, a sua substituição pela política operária liberal.

 

Notas de rodapé:

(1) Sévernaia Pravda (A Verdade do Norte): foi sob este nome que se publicou o jornal bolchevique Pravda em agosto e setembro de 1913.

(2) “Três pilares”: termo convencional na imprensa legal bolchevique e nas reuniões para indicar as três palavras de ordem revolucionárias fundamentais: república democrática, confiscação dos latifúndios, jornada de trabalho de 8 horas.

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- 29/08/2022