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Boletim QUE FAZER, Conjuntura, Destaque, Nacional

Carestia: a burguesia do agronegócio e o governo contra as classes trabalhadoras

Boletim Que Fazer – Março de 2025

A carne, item importante da alimentação dos trabalhadores, está desaparecendo das suas mesas em 2024 pelo absurdo aumento dos preços. A carestia está de volta.

Cem Flores

24.03.2025

A comida está pela hora da morte!

Desde a pandemia de Covid-19 que a carestia está de volta com força. Uma alta e persistente inflação de alimentos está roubando a pouca comida das mesas das classes trabalhadoras, avançando bem mais rapidamente que os salários. Só no mês de fevereiro, o preço dos ovos subiu 15%, e o do café, 11%. Em janeiro, foi a vez dos aumentos da cenoura (36%) e do tomate (20%).

No ano passado, a inflação medida pelo INPC, que serve de referência para as nossas campanhas salariais, foi de 4,8%. Só que as carnes subiram mais de 20% e o cafezinho aumentou quase 40%! E também teve a inflação do leite (19%), do óleo de cozinha (19%), das bebidas (14%), das frutas (12%) e assim por diante.

A carestia dos alimentos está muito maior que a inflação. Por isso, enquanto nos seus palácios o governo comemora o número oficial de aumento real de 3,7% no rendimento médio nacional, na vida real o que a massa trabalhadora sente no seu dia a dia é que a sacola de compras sai do supermercado cada vez mais leve!

Isso vem pelo menos desde a pandemia. Como podemos ver na tabela abaixo, nos últimos cinco anos, o INPC acumulou 35% e o salário-mínimo aumentou 45%. Só que de acordo com o Dieese, a cesta básica subiu 60%!

Uma trabalhadora de salário mínimo já deixa mais de R$ 700 todos os meses só para comprar o básico de alimentos para sua família, quase a metade do seu salário! Se for uma das mais de 20 milhões de mães que recebe o bolsa família, a situação é ainda pior. A bolsa está congelada desde 2023 e o valor médio atual, R$ 668,65, não dá nem para a cesta básica…

O governo burguês de Lula-Alckmin só pensa nas eleições e na defesa do agronegócio!

A reação do governo a essa situação nos últimos dois anos foi nula. Não houve nenhuma medida para aumentar a produção de comida ou baixar seus preços, nada! Só agora, depois que a metade do mandato já passou, o governo finge se preocupar com isso.

E a razão dessa preocupação não é a fome, mas a queda de popularidade no começo de 2025. Numa pesquisa, a avaliação do Lula como “ótimo/bom” caiu de 35%, no final do ano passado, para 24% em meados de fevereiro. E aqueles que acham que o governo está “ruim/péssimo” aumentaram de 35% para 41%. Outra pesquisa mostrou que essa piora também chegou em estados do Nordeste, como Bahia e Pernambuco. Mesmo lá, a parcela da população que desaprova o governo já está maior que a que aprova.

O governo culpou a carestia (e sua comunicação) pela queda de popularidade e passou a tentar se mexer visando as próximas eleições. Lula chegou a visitar, pela primeira vez neste mandato, um assentamento do MST para contar duas potocas: 1) defender a reforma agrária, que ele e seu governo sabotam no interesse dos latifundiários, e 2) ameaçar tomar “medidas drásticas” contra a carestia nos alimentos – no mesmo discurso em que falou que “não queremos dizer que o agronegócio não presta”!

Na realidade, o governo ficou só na tentativa de “encontrar uma solução pacífica sem nada”. Sem nada mesmo!

Faz anos que os governos esvaziaram os estoques reguladores de alimentos e este governo não fez nada! As exportações de alimentos do agronegócio são e seguirão totalmente isentas de impostos. Teto de preço na comida (teto só para os gastos públicos!) ou congelamento dos itens de primeira necessidade então… nem pensar! Sobre essa última medida, o próprio Lula tranquilizou latifundiários e atravessadores, afirmando que não iria fazer nada disso: “Eu não posso fazer congelamento”.

Este governo burguês se omite, como se omitiram todos os anteriores, porque são governos das classes dominantes e são os monopólios nacionais e transnacionais que definem o que produzir, quanto produzir e os preços de venda – com o único objetivo de aumentar os seus lucros!

Mas a carestia e a queda de popularidade passaram a pressionar o governo. E o que o governo fez? Em primeiro lugar, conversou com o agronegócio e deu garantias que nada mudaria. Em segundo, acionou a máquina de propaganda.

Mais de um mês antes do enganador pacote governamental, o ministro da agricultura já havia definido os limites e os objetivos das medidas: “que a gente possa continuar trabalhando sem nenhuma medida heterodoxa, sem nenhuma pirotecnia … para que nós tenhamos excedentes para continuar exportando, bater recordes”. E o ministro ameaçou o governo com sua demissão caso se pensasse em taxar as exportações do agro. A prioridade do governo é o plano safra e suas centenas de bilhões de reais de empréstimos com juros subsidiados para os latifundiários.

No próprio dia do anúncio das medidas de propaganda, o governo – antes do anúncio! – se reuniu com “empresários e representantes de setores da cadeia de alimentos e energia”. No dia seguinte, no mesmo dia da fala de Lula ao MST, o ministro fez questão de desmentir o presidente e mostrar quem manda: “o presidente prefere ‘medidas normais’ para solucionar o impasse … Não queremos nada que seja artificial”.

A principal medida, anunciada com pompa e circunstância por cinco ministros, se limita a zerar o imposto de importação de carne, café, açúcar, milho, óleos, azeite, sardinha, biscoitos e massas alimentícias. Esses produtos não representam, somados, nem 1% das importações brasileiras. Além disso há um pedido para os estados zerarem o ICMS (não há informações de que tenha acontecido), e outras medidas demagógicas (sobre estoques reguladores) e burocráticas (aceleração do Sisbi?).

Sem nenhuma surpresa, a regra de mais um governo burguês continua a ser: ao agronegócio, tudo; aos trabalhadores, nada!

A burguesia do agronegócio e o seu governo não são a solução – são o problema!

O limitado e ineficaz pacotinho do governo, intencionalmente, não atingiu a causa da alta de alimentos no país. Os latifundiários do agronegócio, como toda fração de classe burguesa, direcionam sua produção para onde veem maiores possibilidades de lucro. Não estão nem aí para as condições de vida das classes trabalhadoras – muito pelo contrário! Querem mantê-las nas piores condições possíveis, com apenas o mínimo necessário para sua sobrevivência e reprodução enquanto força de trabalho.

A estrutura agrária brasileira mantém há décadas (senão há séculos) sua enorme concentração fundiária. A modernização do agronegócio no país não apenas não alterou como, pelo contrário, reforçou essa concentração. Somada à concentração das terras, há também a centralização de capitais aplicados no agronegócio, com a criação dos monopólios globais de capital nacional, além da penetração crescente dos monopólios transnacionais no país. O terceiro aspecto é a ascensão da economia chinesa neste século, com sua demanda insaciável por commodities agrícolas, minerais e energéticas.

Por fim, temos a ação do estado capitalista brasileiro no estímulo ao agronegócio e sua virtual monocultura de exportação. Com Lula 3, o agronegócio nunca foi tão beneficiado: os planos safra batem recordes anuais, chegando em R$ 400 bilhões na atual safra. A “reforma” tributária patrocinada pelo governo burguês de Lula-Alckmin previu para o agronegócio um regime diferenciado, mantendo o tradicional privilégio do setor. Com isso, em 2024, as exportações do agronegócio superaram os R$ 880 bilhões.

Qual o resultado dessa “reprimarização” que integra a regressão a uma situação colonial de novo tipo que caracteriza a acumulação de capital e a estrutura econômica brasileira nas últimas décadas? Enquanto a produção de soja aumentou 177,5% em 20 anos, a produção de arroz e de feijão diminuíram! No mesmo período em que a produção de arroz caiu 8% e a de feijão diminuiu 9%, a população do país cresceu quase 18%. Em suma, mais bocas para alimentar, porém com menos comida.

Diante da carestia e da continuidade e intensificação da exploração capitalista, a única saída para a classe operária e as massas trabalhadoras é sua própria organização e luta. As classes trabalhadoras não podem se deixar iludir pelos cantos de sereia de governos burgueses e suas bases de apoio que buscam, acima de tudo, paralisar sua organização de classe independente, desmobilizar suas lutas, para manter e reforçar a dominação burguesa.

 

 

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- 24/03/2025