As greves no primeiro semestre de 2024
Professores e professoras de escolas públicas da cidade do Rio de Janeiro protestam contra os ataques do prefeito Eduardo Paes, em novembro de 2024. A prefeitura, com o apoio de vereadores do PT, busca aprovar o Projeto de Lei Complementar 186/2024, que retira conquistas da categoria e amplia a jornada de trabalho.
Cem Flores
20.12.2024
De acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), ocorreram 451 greves no Brasil durante o primeiro semestre de 2024. Isso representa uma queda de quase 20% em relação ao mesmo período do ano anterior, a primeira redução desde 2021. Esses dados confirmam o cenário atual de estagnação na luta sindical no país.
Mesmo com grandes greves, como a paralisação nacional da educação federal, a ofensiva burguesa conduzida pelos patrões e seus governos continua a pleno vapor, com as classes trabalhadoras em dificuldade de ampliar sua organização e luta. Superar esse quadro é fundamental, e a popularização de pautas como a redução da jornada de trabalho neste final de ano demonstra a possibilidade de retomar as lutas de resistência nos locais de trabalho. Para isso, uma das grandes barreiras a serem superadas é a do peleguismo da imensa maioria dos sindicatos e das centrais, hoje verdadeiros garotos de recado do governo burguês de Lula-Alckmin.
* * *
Como mencionado, houve 451 greves no primeiro semestre deste ano. Isso significou uma redução de 19% em relação a 2023 e de 32% em relação ao pico pós-pandemia, alcançado em 2022. Esse número se aproxima de maneira impressionante da quantidade registrada durante os períodos de auge da pandemia, em 2020 e 2021. Além disso, o número de horas paradas foi de 17 mil, o menor desde 2020.
Tais resultados ocorrem após uma leve recuperação da atividade grevista depois da pandemia e apontam para uma estagnação das greves no país.
As greves caíram tanto no funcionalismo público, quanto no setor privado, que nunca se recuperou de fato da queda durante a pandemia. Segundo o DIEESE, no setor privado, parte significativa é composta por categorias de setor público privatizado ou terceirizado:
“nesse primeiro semestre de 2024, aproximadamente dois terços das greves na esfera privada (116, ou 62%) envolveram trabalhadores que atuam em atividades que, de alguma forma, estão ligadas ao orçamento público – através da concessão de serviços (como no caso do transporte urbano) ou da contratação terceirizada (profissionais que atuam no asseio e na saúde)”.
Em relação ao caráter das greves, as pautas foram mais ofensivas se comparadas com os últimos anos, apesar da presença ainda predominante de pautas defensivas. Reajuste salarial foi a pauta mais comum nessas lutas, junto a melhorias das condições de trabalho. Nesse aspecto, o boletim da FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, da USP) demonstra que, em 2024, a grande maioria dos reajustes salariais tem resultado em pequenos aumentos reais (acima da inflação acumulada no período da data-base). Isso é resultado da combinação de vários fatores: as lutas, apesar de poucas, de caráter mais ofensivo; a inflação no primeiro semestre mais controlada se comparada ao pós-pandemia; o cenário de menor desemprego, que amplia o poder de barganha de força de trabalho.
No entanto, há ainda várias categorias com perdas salariais acumuladas da última espiral inflacionária, e os preços de vários itens essenciais da cesta básica das famílias trabalhadoras voltaram a subir. Sendo assim, esses resultados melhores nas negociações não têm gerado um alívio significativo frente à carestia, que continua nas alturas. Por exemplo, no final de 2019, em SP, com R$ 500 era possível realizar uma compra mensal de alimentos básicos no mercado, segundo base de dados do DIEESE. Hoje, para comprar os mesmos alimentos, se gasta R$ 800. Um aumento de 60% em 4 anos, enquanto o salário mínimo aumentou apenas 40%.
Isso sem contar a exploração, que só aumentou nos últimos anos, com terceirização em larga escala, contratos temporários, trabalho por aplicativos… Um resultado é o aumento de acidentes de trabalho que resultaram em mortes: após queda entre 2015-20, o número voltou a subir e hoje passa de 2 mil por ano – dados esses com imensa subnotificação, pois só consideram os trabalhadores formais e com “acidentes” devidamente registrados. O Brasil segue sendo um dos países que mais matam trabalhadores nos locais de trabalho no mundo!
No primeiro semestre de 2024, foram registradas várias greves do funcionalismo público federal contra a política de arrocho salarial e orçamentário do governo Lula-Alckmin – de aumento nominal zero para este ano. Além da mobilização da educação, houve também no INCRA, no IBAMA, no INSS e no IBGE. No funcionalismo estadual e municipal, novamente a educação foi o setor que mais paralisou. Os professores de escola pública do país têm passado não apenas por anos de arrocho salarial como também por piora constante da situação de trabalho e perda de conquistas. Hoje, a maioria dos professores nessas redes de ensino é temporária, com contratos de trabalho extremamente precários.
Na esfera privada, o setor de serviços representou mais de 60% das greves, seguido pelo industrial. Essas greves foram bem mais defensivas. Na indústria, as regiões sudeste, sul e nordeste concentraram a grande maioria das greves. Metalúrgicos e trabalhadores da construção civil foram as categorias de maior mobilização. O operariado, mesmo em situações tão adversas, produziu importantes resistências, como a greve na REFAP, em plena catástrofe ambiental no Rio Grande do Sul.
Mobilização operária na REFAP (Refinaria Alberto Pasqualini), em Canoas (RS), abril de 2024.
* * *
Neste ano, o atual governo burguês e seus braços no movimento sindical e popular, continuaram a agir ativamente para conter a revolta das massas trabalhadoras, enrolá-los com mil promessas e espaços de “participação” nas instituições burguesas e suborná-los aos interesses dos patrões.
Quem não se lembra da promessa de direitos para os trabalhadores de aplicativo na campanha de Lula-Alckmin em 2022? Da sabotagem às paralisações logo no começo de 2023 com várias rodadas de “negociação” com “representantes”? De concreto, após dois anos de enrolação, nada saiu, exceto a tentativa bem-sucedida de minar a luta dos trabalhadores e um cínico projeto de lei que formaliza uma relação de trabalho abaixo dos parâmetros mínimos da atual legislação trabalhista.
Mais uma vez, o primeiro de maio puxado pelas centrais foi um evento burocrático e eleitoreiro, feito para dar palco a Lula e seus candidatos às eleições municipais. Nada poderia ser mais distante das reais necessidades e demandas das classes trabalhadoras do país!
* * *
Nosso patamar de luta está baixo no país, mas o que não falta é trabalho e construção a se fazer! Temos o desafio de continuar nas lutas por salários, redução de jornadas, melhores condições de trabalho, construindo organizações e coletivos autônomos de trabalhadores e trabalhadoras e rompendo com as amarras e as ilusões do peleguismo e desse governo.
A LUTA CONTINUA!