CEM FLORES

QUE CEM FLORES DESABROCHEM! QUE CEM ESCOLAS RIVALIZEM!

Cem Flores, Conjuntura, Destaque, Nacional

O Caráter de Classe Burguês do Governo Lula-Alckmin

Troca de afagos entre Lula e Lira para acordões e conchavos sobre votações no congresso, entrega de ministérios ao centrão e pagamento das bilionárias emendas parlamentares.

Cem Flores

17.10.2023

O governo burguês de Lula-Alckmin já completou nove meses e meio de muitas realizações para a consolidação e o avanço da ofensiva de classe burguesa contra as classes dominadas no Brasil. Desde a campanha eleitoral de 2022 – na verdade, desde antes, desde os primeiros governos do PT – temos afirmado esse seu caráter de classe, buscando comprová-lo com a análise das políticas adotadas, das alianças realizadas e dos resultados alcançados em prol da burguesia. Os camaradas e leitores encontrarão ao final deste artigo uma lista de documentos do Cem Flores a esse respeito.

Nesta publicação realizamos um panorama dessas principais realizações do governo burguês de Lula-Alckmin neste primeiro ano incompleto de gestão. Posteriormente iremos ampliar e aprofundar esta análise, apresentando mais evidências para comprovar nossa tese fundamental, a de que o governo Lula-Alckmin é um governo burguês, cuja função é gerir o capitalismo brasileiro para manter as elevadas taxas de lucro/exploração dos últimos anos.

O governo burguês de Lula-Alckmin busca cumprir essa sua função de duas formas fundamentais:

  1. A consolidação dos avanços do programa hegemônico da burguesia obtidos nos últimos anos (“reformas” previdenciária, trabalhista, privatizações, concessões entre outros) e a busca por avanços nessa ofensiva de classe (novo teto de gastos do PT, “reforma” tributária, concessões, PPPs etc.) e
  2. A conciliação de classes, na verdade subordinação das massas trabalhadoras à burguesia, seja via cooptação dos movimentos sindicais/populares (inclusive com cargos, grupos de trabalho e verbas públicas), seja pela sabotagem direta das lutas das massas.

Diante desse cenário, a única conclusão possível às/aos comunistas é que não nos cabe qualquer tipo de ilusão com esse governo burguês. Formulações oportunistas e/ou eleitoreiras como as de “apoio incondicional”, “apoio crítico”, “independência” ou semelhantes são apenas diferentes formas de abdicar da luta de classes contra a burguesia, seus governos e seu estado, expressando a conciliação/subordinação aos seus interesses, ainda que buscando disfarçá-la sob o manto das “frentes amplas” e/ou do combate ao “fascismo” (sob hegemonia burguesa).

À classe operária, às demais classes exploradas e aos/às comunistas cabe se opor decididamente contra a burguesia, seus governos, seu estado e seus aliados reformistas, oportunistas, pelegos. Nesse combate é que conseguiremos reerguer a força organizativa, política e ideológica da classe para maiores combates futuros!

As principais medidas do governo burguês de Lula-Alckmin até o momento

O governo burguês de Lula-Alckmin começou com o ato golpista da extrema-direita bolsonarista de 8 de janeiro. Na sequência, o novo governo imediatamente reforçou sua atuação exclusivamente institucional em defesa da “normalidade” burguesa. Faz parte dessa política de conciliação de classes considerar que as forças armadas, trocados os seus comandantes, retomariam sua “tradição legalista” (sic!). O “combate ao fascismo” da propaganda da “esquerda” reformista e oportunista continuou inteiramente terceirizado para o poder judiciário, para não atrapalhar a agenda de Lula e Haddad de consolidação e avanços na implementação do programa hegemônico da burguesia e a retomada dos lucros.

Como afirmamos no nosso documento de janeiro, o governo Lula-Alckmin tem como função prioritária atender

a demanda da burguesia por ‘estabilidade’ para a continuidade e a consolidação de sua dominação de classe sobre o proletariado e as demais classes dominadas. Não por coincidência, esse é exatamente o papel desempenhado por Lula e pelo PT nos seus governos anteriores, que prometem repetir no atual.

Os primeiros 100 dias de governo burguês de Lula-Alckmin foram concluídos com a apresentação do novo teto de gastos do PT, para substituir o velho teto de gastos de Temer, inteiramente desacreditado por Bolsonaro e Guedes após o pacotão eleitoreiro de mais de R$ 300 bilhões em 2022. A diferença entre os dois se limita a 2,5% ao ano, percentual máximo do crescimento da despesa pública pelo novo teto de gastos, mantidos o compromisso com resultados primários crescentes e redução da dívida pública, a sistemática de contingenciamento dos gastos públicos para atingir as metas (até agora, pouco menos de R$ 4 bilhões), a eliminação dos mínimos constitucionais de saúde e educação e a continuidade das “reformas” do capital. Como afirma Haddad, essas medidas “sinalizam ao investidor que o país está com um futuro promissor pela frente … Muita gente vai olhar para o Brasil e dizer ‘agora dá para confiar nesse país’”.

Afirmações como essas são pura e simplesmente autoelogios do PT como o mais qualificado e experiente serviçal dos patrões para gerir os “negócios comuns de toda a classe burguesa.

Os primeiros seis meses do governo burguês de Lula-Alckmin foram encerrados com a aprovação, na câmara dos deputados, da “reforma” tributária – mais um passo adiante no programa hegemônico da burguesia e no avanço dos interesses das classes dominantes. Não se trata do hipócrita “colocar o rico no imposto de renda”, mas de reduzir os custos para o capital e, consequentemente, aumentar os seus lucros. Como afirmamos em nosso documento de maio de 2020:

Do ponto de vista da acumulação de capital e da retomada da taxa de lucro, o núcleo fundamental desse programa hegemônico é um conjunto de reformas econômicas (previdênciatrabalhista-sindical, fiscal e tributária, administrativa, privatizações etc.) que a burguesia entende necessárias para a redução do valor da força de trabalho e dos custos salariais das empresas, para a maior ‘flexibilização’ (precarização, informalidade, etc.) do mercado de trabalho, para a ampliação das esferas de acumulação de capital, etc. Para a classe operária e demais classes dominadas, esse programa significa um conjunto de ataques das classes dominantes que visam aumentar sua exploração”.

Os primeiros nove meses do governo burguês de Lula-Alckmin foram marcados pelo anúncio da “parceria com o setor privado”, via “concessão ou PPP (Parceria Público-Privada)”, como “carro-chefe” dos investimentos do novo PAC, nas palavras do ministro-chefe da casa civil, Rui Costa, durante o lançamento desse programa, significativamente na sede da Fiesp. Essas modalidades “envergonhadas” de privatização passam a incluir, por decisão de Lula, transporte, energia, educação, saúde, meio ambiente, presídios entre outros novos setores, com incentivos fiscais e todo o apoio do BNDES.

Além de ampliar os espaços para acumulação/lucros dos patrões, as privatizações de presídios representam que o governo do PT passa a fazer isso diretamente como função do aumento da repressão e do encarceramento em massa, principalmente da população trabalhadora, de periferia e negra.

Essa repressão se consolida em todo o país com os homicídios cometidos pelas polícias, com destaque para a Bahia, governada pelo PT faz mais de 16 anos, incluindo dois mandatos do mesmo Rui Costa. Nos governos de Rui Costa, de 2015 a 2022, os assassinatos por policiais quadruplicaram, passando de 354 para 1.464. Após mais uma chacina, o atual governador do PT elogiou a “firmeza” da polícia, ecoando o elogio de Rui Costa ao policial assassino, “um artilheiro em frente ao gol”, após a chacina do Cabula. No país todo – descontando os mortos pela polícia – foram quase 20 mil mortes violentas no primeiro semestre deste ano.

Assumir a condição plena de gestor do capital também exige do PT a manutenção dos elevadíssimos níveis de repressão e violência do capitalismo brasileiro, ou mesmo o seu aprofundamento, tarefa à qual o PT se dedica sem nenhum constrangimento.

Além dessas ações do governo burguês de Lula-Alckmin, eles também consolidaram os avanços anteriores da ofensiva de classe burguesa nos governos Dilma, Temer e Bolsonaro por suas “omissões”. Nem durante a campanha eleitoral nem, muito menos, no governo, Lula deu uma só palavra sobre a “reforma” da previdência (iniciada por Dilma, proposta por Temer e aprovada sob Bolsonaro). Ao contrário, seu ministro da casa civil garantiu que “Não há nenhuma proposta sendo analisada e pensada neste momento para revisão de reforma, seja previdenciária ou outra. Neste momento não tem nada sendo elaborado”. Idem sobre a “reforma” trabalhista (aprovada sob Temer e reforçada sob Bolsonaro), exceto para possibilitar reconstituir o caixa milionário da pelegagem. Também nada sobre reverter nenhuma privatização ou concessão de Bolsonaro. Pelo contrário, Lula pretende fazer novas!

Com essas “omissões”, Lula e o PT garantem o patamar mais amplo conquistado pela ofensiva da acumulação de capital da burguesia e seus recentes lucros recordes, que também representam maior patamar de exploração e piora nas condições de vida das massas trabalhadoras.

O partido da ordem (PT) em dois momentos. Em fevereiro, seu vice-presidente abraça o genocida general bolsonarista, sob o pretexto de “ganhar a direita” para “unir, pacificar e reconstruir”. Em 5 de outubro, na véspera da privatização do presídio de Erechim, patrocinada pelo PT, um dirigente do PT defende a prisão perpétua, buscando garantir a “clientela” para os lucros dessa privatização.

Diz-me com quem andas e te direi quem és!

O governo burguês de Lula-Alckmin também se caracteriza pelo avanço da participação formal da direita, reforçado com a reforma ministerial para abrir mais espaço ao centrão de Lira e (muito bem) pago com quase R$ 25 bilhões em emendas parlamentares. Esse avanço também inclui a conciliação com as forças armadas, seja mediante a manutenção de sua plena autonomia e de todas as suas regalias, seja mediante recursos bilionários no novo PAC (R$ 53 bilhões, mais que os investimentos previstos em educação, R$ 45 bilhões, e em saúde, R$ 31 bilhões).

Todo o discurso eleitoral e institucional de “frente ampla” e de “combate ao fascismo” apenas servem ao PT como um disfarce conveniente para “justificar” seu papel de partido da ordem e de governo burguês, ao tentar estabilizar a gestão do capital, consolidar e promover novos avanços na ofensiva das classes dominantes.

Paralisar a luta de massas é um objetivo do governo burguês de Lula-Alckmin

Além de consolidar/avançar os ganhos recentes da ofensiva de classe da burguesia, o PT, enquanto partido da ordem, e o governo Lula-Alckmin, enquanto governo burguês e gestor do capital, também atuam para garantir a conciliação/subordinação das classes dominadas. Essas ações vêm de longo tempo, a partir do controle amplamente majoritário das entidades sindicais e populares pelos pelegos reformistas e oportunistas do PT, da CUT e seus satélites. Sua atuação, tanto ideológica quanto objetivamente, busca a paralisia das massas trabalhadoras e sua desorganização, seja pela noção de que as direções substituem as bases, seja pela integral aposta institucional. No governo, essa ação se reforça via cooptação, mediante cargos, verba pública e a criação de inúmeros grupos de trabalho, fóruns tripartites e a canalização das demandas para ministérios e outras vias institucionais. Claro que, quando isso não é suficiente, entra no jogo a sabotagem governamental explícita contra manifestações de massa, como foi o caso da greve dos aplicativos, em janeiro.

Controlar, limitar, pacificar e institucionalizar a luta e a organização das massas trabalhadoras é um dos principais serviços que o reformismo e o oportunismo prestam à burguesia.

Contra a “normalidade” para a burguesia, muita luta operária!

Esses marcos políticos dos primeiros nove meses do governo burguês de Lula-Alckmin mostram o sentido da troca de guarda da gestão do estado capitalista no Brasil. Do bolsonarismo – sob o qual a gestão desse estado esteve dirigida pelas facções mais reacionárias, fascistas, da burguesia – para uma tentativa de retorno a uma gestão burguesa mais “normal”, “estável” e “eficiente”.

Se o sentido dessa transição é uma maior “normalidade”, o objetivo do governo burguês de Lula-Alckmin é consolidar os avanços recentes da ofensiva burguesa em sua luta de classes contra as classes dominadas, ao mesmo tempo em que busca dar novos passos nessa ofensiva.

Ao proletariado e ao conjunto das massas trabalhadoras do campo e da cidade só há um caminho possível, ainda que difícil e longo: o da organização própria e independente, do reforço das suas lutas de classe em defesa dos seus interesses próprios, resistindo à ofensiva burguesa até acumularmos forças para iniciar a ofensiva proletária!

Cem Flores

Outubro de 2023


Aos/às camaradas que quiserem aprofundar os temas apresentados neste texto, recomendamos a leitura dos nossos seguintes documentos:

Documento Base, de agosto de 2023.

Especialmente o item “O PT, de socialdemocrata a partido burguês, um partido da ordem capitalista”.

Livro digital Quem São os Nossos Inimigos? Quem São os Nossos Amigos? Essas São Questões Fundamentais!, de setembro de 2022.

Especialmente o capítulo 4, sobre a campanha Lula-Alckmin e os governos anteriores do PT, e o anexo 2, sobre as “frentes amplas”.

Livro digital O Governo Bolsonaro: ofensiva burguesa e Resistência Proletária, de maio de 2019.

Especialmente os capítulos sobre as “reformas” burguesas da previdência (cap.3) e trabalhista (cap. 4) e sobre a repressão capitalista (cap. 6).

A reunião ministerial e o programa hegemônico da burguesia no Brasil, de 26 de maio de 2020, artigo no qual detalhamos o que entendemos ser o programa de classe da ofensiva burguesa.

A vitória eleitoral de Lula-Alckmin, a reação da extrema-direita, fascista, e as tarefas das classes trabalhadoras e dos/as comunistas, de 18 de novembro de 2023, no qual analisamos a vitória da chapa Lula-Alckmin e as perspectivas de classe do seu governo.

O capitólio bolsonarista: novo passo na escalada golpista da extrema-direita, fascista, no Brasil, de 24 de janeiro de 2023, em que analisamos a reação meramente institucional da “esquerda” ao ataque da extrema-direita.

O início do governo Lula-Alckmin: a consolidação da ofensiva burguesa e a volta da política de cooptação, de 27 de março de 2023, especialmente o trecho sobre a volta da política de cooptação do petismo.

Live Balanço dos 100 Dias do Governo Lula/Alckmin, de 10 de abril de 2023, na qual realizamos uma avaliação da conjuntura política atual no Brasil e do governo burguês de Lula-Alckmin.


Além disso, é muito importante a contribuição dos/as camaradas às atividades do Cem Flores. Vocês podem contribuir financeiramente com uma contribuição periódica por meio do PIX cem.flores.desabrochem@gmail.com.

Os/as camaradas também podem comprar os livros publicados pelo Cem Flores, ao preço de R$ 25 (mais frete):

Documento Base

Quem São os Nossos Inimigos? Quem São os Nossos Amigos? A conjuntura econômica e política brasileira e a posição comunista

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- 17/10/2023